Manhã de
verão, indo para o trabalho. Trem absurdamente lotado. As pessoas mal
conseguiam mover os pés. Não havia espaço. Tão concentrados que garantiam o
equilíbrio no balanço do trem. Batalha de perfumes e cabelos molhados, cheirando
a condicionador, que te ensopa a camiseta, compete com o sujeito que tenta ler
um jornal, esfregando as folhas em tua cara.
O falatório
dentro de uma composição lotada é algo, literalmente, incompreensível.
Romances, brigas, futebol, política e fofoca é o suco final desse
liquidificador coletivo.
Ao meu lado,
em meio a esse burburinho, ouço uma voz mais alterada que se sobrepunha às outras. Era uma senhora de meia idade que gritava histericamente com cada
homem que encostasse nela, como fosse possível evitar isso dentro daquela Auschwitz sobre trilhos. E o pior, na tentativa
de afastar-se de qualquer homem, ela vinha gritando e se aproximando de costas
para mim.
Não deu outra. Bateu de bunda na lateral do meu comprimido e pudico corpo.
Olhou-me e começou a me xingar, dizendo que não encostasse nela e
sei lá mais que injúrias e impropérios. Espremendo daqui e dali consegui
afastar-me da senhora com pretensões a ser abusada por todos os homens, grande
maioria, ali presentes.
- Eu é que não quero ser encostado pela senhora. Não quero ser
contaminado! Disse-lhe com um canastrão ar de indignidade.
Entre raivosa e espantada, ela mordeu a isca dizendo que não tinha
nenhuma doença.
- Minha senhora, ignorância também pega. Falei olhando firmemente pra
ela e mantendo prudente distância.
Com algumas risadas equilibrou-se o burburinho. Calou-se como dormentes.
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