segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

PÓS PARTO

Reunido nesse pós-natal com minha irmã, sobrinhos e sobrinhos-netos (não sei se existe tal grau de parentesco) e ouço palmas no portão. Vem minha sobrinha-neta avisar que tem gente chamando.
Vou até lá. Duas meninas muito bonitas, vestidas no último modelito evangélico.
- Boa tarde. Posso ler um trecho da bíblia para o senhor?
- Sou ateu, respondi com toda cortesia.
- O senhor é ateu? desde quando? foi algum trauma?
- Sou ateu desde quando comecei a me entender como gente.
- Mas o senhor é muito simpático. Veio nos atender com simpatia.
- Procuro ser educado.
- Eu respeito o senhor por ser ateu, mas posso ler um trechinho da bíblia?
- Ok, se for curto, tudo bem.
Ela abre o santo livro em uma página qualquer e anuncia, antes de começar a ler.
- É Coríntios...
- Puxa, que sorte, além de ateu, também sou corintiano, falei com meu melhor humor.
- O senhor é muito simpático, respondeu com um sorriso que já queria virar risada.
Leu o tal trechinho, do qual não me lembro mais nada. A outra, mais séria, a puxou pra ir embora.
Algumas vezes penso que sou um santo homem.

SOBRE O JOÃO

O João era um caso único em nossa turma. De um lado um humor fantástico, divertido e exuberante, de outro um mau-humor corrosivo e despeitado. A própria cizânia.

Entre o fim da década de 1960 e meados da década de 1970, tínhamos o hábito de fazer uma espécie de “teatro de rua”. Tudo de improviso. Não importava se tinha gente ou não. Geralmente era o João que lançava uma ideia, uma história e íamos atrás desenvolvendo. Isso em qualquer lugar ou qualquer hora. Éramos bons nisso. Todos tinham uma rapidez em perceber e desdobrar o que era proposto.

Uma noite, a Praça Santo Antonio, no centro de Caieiras, estava lotada. Mulheres e homens elegantemente vestidos para ir ao baile de réveillon. E nós ali, ripongos, observando a cena.

O João caminha lentamente para o centro da praça, em meio à multidão, se joga ao chão, estrebuchando como se fosse uma convulsão. O Emi, irmão dele, já percebendo a coisa começou a gritar, como que desesperado:

- João, o que está acontecendo? Socorro, ajudem meu irmão! Fomos todos juntos, ali tentando segurá-lo. Gritávamos, como que sem ação, pedindo ajuda.

Formou-se uma imensa roda de curiosos pré-réveillon. E nós ali, “desesperados”. E o João ali, estrebuchando e até babando. Dona Rosa, uma senhora idosa, minha vizinha, se ajoelhou para ajudá-lo.

Repentinamente o João solta um berro, daqueles horrendos, levanta-se do chão todo torto, babando, e vai pra cima das pessoas. Era gente correndo pra todo lado. Esvaziou a praça. A dona Rosa nem sei onde foi parar.

Talvez irracionalmente, essas encenações de pânico eram feitas próximo às pessoas de boa índole da sociedade cristã caieirense. Pessoas que procuravam nos marginalizar, que nos taxavam de maconheiros, vagabundos, viados... escória. Racionalmente era uma maldade, mas como era divertido.

Por outro lado, tudo de bom que pudesse acontecer com você e fosse contar ao João, já provocava seu mau-humor. Sua autoestima era tão baixa que entendia como querer humilhá-lo. Não aceitava nada de bom para as pessoas que não tivesse a intenção de diminuí-lo. João nunca havia namorado. Nunca havia beijado uma menina. Claro, algumas pessoas da turma, de caráter mais cruel, jogavam isso na sua cara, com a intenção, aí sim, de humilhá-lo diante de todos. Hoje tenho uma compreensão um pouco melhor de toda essa situação.  

Da turma ele era o único que não dava uns tapas na pantera. Nem podia saber. Apenas desconfiava.

- Emi, se eu souber que você está fumando maconha, eu conto pro papai. Essa ameaça era constante.

Nessas questões, por prudência, o mantínhamos à distância, afinal o tal papai era um homem bronco que costumava dizer aos filhos: do jeito que te pus no mundo, eu faço você voltar.


João morreu afogado em um acampamento que fizemos em um feriado de 7 de setembro de 1975. Mas essa história fica pra depois. Eu e ele tínhamos 20 anos.

DOS MORTOS-VIVOS

Du e Di eram gêmeos. O Du era mais moreno, magro e alto. O Di era bem loiro, baixo e mais robusto. O que tinham em comum era o cabelo espetado.

Eu os conhecia desde a mais tenra infância, pois eram nossos vizinhos. Nunca desenvolvemos uma grande amizade, mas nos dávamos bem. Estudamos e jogamos bola juntos, trocávamos gibi e brincadeiras coletivas de moleque.

O Du sempre encontrei por aí. Ele trabalhava no centro de Caieiras e sempre nos trombando, nos cumprimentando e breves conversas de como você vai e comigo tudo bem. O Di nunca mais vi. Muitos anos sem vê-lo e não havia me apercebido disso.

Um dia acabei lembrando-me da ausência do Di. Falei com uma pessoa muito conhecida da família dele, que me informou que ele havia morrido há alguns anos. Fiquei chateado, pois justificava sua ausência, mas não minha desatenção.

Tempos atrás, andando na Rua João Dártora, escuto alguém me chamar do outro lado da rua, em um ponto de ônibus cheio de gente. Demoro um pouco pra identificar a pessoa no meio da pequena “multidão”. Para minha surpresa vejo o Di. Surpresa por achar vivo quem eu já achava morto.

Assim sem entender muito a situação, pois é difícil desacomodar nossos mortos que ressurgem, atravessei a rua para cumprimentá-lo. Apertamos nossas mãos, depois um abraço. Sim, ele estava vivo.

Repentinamente o Di se ajoelha diante de mim, pega minhas mãos e começa a beijá-las. Com a voz embargada de um quase choro, ficava repetindo:

- Obrigado, Rubinho. Obrigado. Você veio falar comigo. Ninguém fala comigo. Todo mundo foge de mim.

Meu mundo caiu naquele instante. Mais desamparado que ver um ex-morto. As pessoas ali presentes não menos espantadas que eu pela cena. Parece que o mundo silencia nesses momentos. Totalmente constrangido, me lembro de que tentava levantá-lo, só conseguindo dizer:

- Cara, para com isso! Por favor, para com isso!

Acho que trocamos mais algumas palavras e um último abraço antes que seu ônibus chegasse.

Esse é um mal-estar que carrego até hoje comigo. Sem nunca ter sabido o que ocorreu durante o tempo em que esteve “morto”, fico me perguntando o quanto o mataram nesse tempo. O quanto ele se matou.


Depois disso nunca mais vi o Di. Talvez seu destino seja permanecer morto.

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

REFLEXÕES INTEMPESTIVAS Nº 04

Saber-me existir em você 
é mais belo mistério 
que vivo e não desvendo.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 25

Entre a lei de deus e a lei dos homens, nos coube o papel de vítimas coadjuvantes. 

DOS TEMORES

Chego do serviço, minha mãe próxima aos 90 anos de idade, conta que dois rapazes, que ela acreditava gente do governo, vieram entrevistá-la, pois era a funcionária mais antiga do hospital psiquiátrico do Juqueri que haviam encontrado ainda viva.

Não sei se eram do governo, se eram estudantes ou jornalistas. Não sei.

Minha mãe me fala, bem baixinho, com um sorriso malandro nos lábios:

- Só contei as coisas boas. Não falei nada das coisas ruins, pois eu não sei quem é essa gente e o que eles podem aprontar.

Com seus quase 90 anos e ainda temerosa de consequências ruins por parte do governo. Resultado das perseguições políticas sofridas, por ela e meu pai, enquanto funcionários do estado. Pré e pós-ditadura.

Fico pensando no poema Kaddish, do Allen Ginsberg. Sua mãe, comunista, transtornada, morrendo e achando que Hitler iria matá-la.


Fico pensando sobre aquilo que fazem com a gente.

DAS FACILIDADES

Minha mãe era uma mulher que não aceitava facilidades. Criada em sítio, ainda menina teve que trabalhar como doméstica. Aos quinze anos começou a trabalhar no hospital psiquiátrico do Juqueri, onde se aposentou. Ali dentro nunca nos preservou do contato com os internos, sempre tratados com dignidade. Éramos iguais.

Histórias do Juqueri são tantas. Cidinha, menina negra, que se dizia amante do Bandido da Luz Vermelha. Menina doce que nos tratava com muito carinho e vivia grudada em minha mãe. Menina que não podia ter qualquer objeto cortante ao seu alcance. Mutilava-se, sangrando, cicatrizes sobre cicatrizes outras que desconhecíamos. Cabelos curtos, muito limpos, roupa de interna, carimbada, e um sorriso que não ouso tentar repetir aqui.

Histórias do outro lado do muro. Minha mãe arrombando a porta do um banheiro, onde um médico psiquiatra estava morrendo sufocado pelas próprias fezes. Ela tendo que enfiar o dedo na garganta para salvá-lo de um prazer, que naquele momento o matava. Salvou.

Interna enorme, forte, após momento de muita agressividade, onde quase matou outra interna, implorava à minha mãe: “fia, não deixa eles me dá eletrochoque. Vou Morrer!”. E morreu.

Não, ela não aceitava facilidades. Fez meu pai devolver pra loja uma enceradeira que havia comprado, pois não abria mão do seu escovão. Com o escovão ela passava palha de aço para tirar o restante da encerada anterior. Ajoelhada, com um pano nas mãos, passava a cera. Seca a cera, com o escovão, dava o lustro. Enceradeira, jamais!

Assim, nunca aceitou a batedeira de bolo, que ficou para sempre encostada num canto do armário. Ela fazia e batia sua massa de bolo. Da mesma forma com o pão, com a massa de pizza e etc. A única facilidade que aceitou foi o liquidificador. Em verdade pouco usado. Máquina de lavar roupas, nem pensar!

Acredito que, por herança, também não sou de aceitar facilidades. Também tenho o agravante de não facilitar muito.

Quando casado, a Marli resolveu comprar uma máquina de lavar louças. Lavar a louça era uma das minhas tarefas na divisão de trabalho de casa. Com pouco tempo de uso fui me incomodando com a máquina pelo trabalho que dava, além do serviço porco. Não pensei duas vezes: peguei a incompetente serviçal mecânica e coloquei no lixo. Sem mais.

A máquina de lavar roupas raramente usava. Sempre preferi lavar minhas peças ali no tanque. Resultados outros.

As pessoas, habituadas aos confortos do mundo moderno, me questionam com certa insistência a razão pela qual não compro um carro, uma máquina de lavar e não sei mais lá quantas coisas. Pra não haver tanta teimosia, respondo que, ou não quero ou não posso. Ou ainda que não posso e não quero. Simples.

Lavar louças, lavar e passar roupas, andar de ônibus, trem ou metrô, é onde me abstraio. É onde posso ser humano. É onde extraio o melhor que posso me dar e poder oferecer-me. Eis, nesses momentos, onde me sei no mundo e em mim ele pletora.


Sei muito bem o cansaço e dor física que essas atividades proporcionam. O mesmo cansaço e dores da minha mãe, já idosa e quase incapaz, insistindo em executá-las. E querem tirar isso da gente. Querem nos tirar a única dor que nos escuda no enfrentamento com as dores do mundo. Querem nos dar a comodidade alienante de um corpo no sofá.

Quem viveu e viu há de me entender.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

DA FILOSOFIA DIRETA

No texto “Espionagem” falei sobre um tal chefinho medíocre durante o tempo em que trabalhei na prefeitura de Caieiras. Em razão dessa história que contei, e outras que ainda poderei contar, cortei qualquer proximidade, da pouca que já havia, com o sujeito.

Ele católico, “kantiniano”. Eu, ateu, “nietzscheniano”.

Tivemos alguns arranca-rabos pretensiosamente filosóficos.

Um dia, não sei por qual razão, emprestei a ele um livro. Fico em dúvida se foi A República, do Platão ou Emílio ou da Educação, do Rousseau.

Muito tempo depois, já rompidos e eu fora da prefeitura, ele foi me devolver o livro. Bateu palmas no portão de casa. Eu não estava e minha filha, Maíra, com seus 6 ou 7 anos, atendeu.

- O que você quer? Meu pai não gosta de você!


Ah, como amo esses meus filhos! 

DA MÁ EDUCAÇÃO

A Maíra estava com 5 ou 6 anos. O Raoni entre 3 e 4. O governo do estado havia criado um projeto pré-escolar, que se pretendia moderno. A escolinha era bem próxima da nossa casa, e a Marli, então professora estadual, resolveu matriculá-los. A diretora, razoavelmente conhecida da Marli, era toda simpatia.

Começamos a estranhar a relutância do Raoni em querer ir pra tal escolinha moderna. Chorava muito, esperneava em uma resistência fora dos padrões do seu comportamento habitual.

Um dia, a toda simpática diretora veio nos contar, entre espantada e incrédula, o entrevero que teve com meu filho, que não parava de chorar. Claro, ela foi dar-lhe uma bronca, que depois soubemos ser sua forma de lidar com crianças. Segundo ela, o Rá parou de chorar na hora, enfiou o dedo na sua cara e disse:

- Eu não gosto que gritem comigo!

Ainda hoje fico imaginando a cara da mulher ao ser confrontada dessa maneira por uma criança de 3 ou 4 anos.


Dona Idalina, acho que era esse seu nome, era a merendeira da escolinha. Foi ela quem nos contou como era o tratamento grosseiro dado pela diretora simpática às crianças. Tiramos nossos filhos da escola e, nesse curto período que ficaram, desenvolveram uma grande afeição pela dona Idalina, única a tratar os pequenos com humanidade, que mantiveram até a idade adulta. Anos depois, quantas vezes a encontrávamos na rua e ela vinha abraçá-los e beijá-los. Eram ainda as suas crianças.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

ESPIONAGEM

Começo dos anos de 1980, trabalhando na prefeitura de Caieiras, entrou um rapaz bem mais novo que eu pra trabalhar em nosso departamento. Ivo foi, e ainda é, uma das pessoas mais honestas que conheci. De uma simplicidade tão autêntica que ainda me emociono das suas e nossas diversas histórias.

O chefe do departamento era um sujeito medíocre que, embora não fosse um grande amigo, tinha certa aproximação comigo desde a infância. Logo após esse fato que vou relatar perdemos essa aproximação.

Havia uma questão que preocupava o chefinho: o Ivo era filho de um vereador. Em sua tresloucada mesquinharia achou que o pai havia “plantado” o filho ali no departamento para tomar o seu tão precioso cargo. Cargo mantido pela relação de servidão bovina a qualquer superior.

Sentindo-se ameaçado começou a articular junto aos seus pares uma forma de prejudicar o garoto.

Como tínhamos amigos em todos os departamentos da prefeitura e por sua pouca habilidade como articulador, ficamos sabendo de suas maquinações.

Conversei com o Ivo e expliquei que tinha um plano pra acabar com aquilo. Combinamos que no dia seguinte, a um sinal meu, ele me deixaria a sós com o famigerado chefinho, pois eu o queria totalmente desarmado.

No outro dia levei um gravador, aquele tipo tijolão, e coloquei na gaveta da minha mesa. Assim que o “cargo ameaçado” chegou dei um toque para o Ivo sair.

Coloquei o bicho pra a gravar e no meio de um papo descontraído com o chefinho comecei a insinuar, bem de leve, maledicências contra o prefeito e vereadores. Não deu outra: o sujeito desandou a meter o pau no mandatário, a ofender vereadores, outros chefes e diretores. Era a indignação contra o poder público em pessoa.

Tendo conseguido o que queria, chamei o Ivo, tirei o gravador da gaveta e coloquei pra rodar a gravação. O cara, covarde como era, ficou pálido, gaguejando e tremendo. Nem ódio conseguiu sentir naquele momento.

Disse a ele que sabia das suas manipulações pra tentar prejudicar o Ivo, e que se ele fosse prejudicado de alguma maneira aquela fita iria parar nas mãos do prefeito. Nunca mais se meteu a besta.


Eu e o Ivo trabalhamos ainda um bom tempo juntos. Acabou saindo da prefeitura um pouco antes da minha saída. Sei que está bem, mas eu o vejo raramente.

MEGA REVOLUCIONÁRIOS EM BITS OU BYTES

Dentro do senso comum o "revolucionário" é aquele que faz. Aquele que é o exemplo. Aos demais cabe incitar e esperar que ele faça.

HISTÓRIAS DE QUANDO O BOI DORME

Observando hoje toda a movimentação desse governo golpista, com sua submissão à voracidade excludente do capital, lembro-me de quando era funcionário concursado da prefeitura municipal de Caieiras, onde a igreja e grandes empresas sempre determinaram os passos de governantes ignorantes, capachos e corruptos.

Em meados e fins da década de 1980 o prefeito encaminha um projeto à câmara municipal, disfarçado como um novo organograma, com o objetivo claro de cercear as ações de funcionários estáveis (concursados), dificultando a ascensão em termo de carreira e alguma coisa referente a salários, que já não me recordo mais. No bojo desse projeto havia também uma série itens que prejudicava em muito aos funcionários contratados pelo regime da CLT.

Com uma câmara municipal composta de vereadores venais, era óbvia a aprovação de tal projeto. O “menos pior” desses vereadores, como diria meu pai, não sabia fazer o ó com o cu.

Fui articulando, juntamente com alguns conhecidos, alguma forma de organização que pudesse fazer um enfrentamento e coibir a aprovação de tal “organograma”.

Nesse ínterim, um funcionário que cuidava da limpeza externa da prefeitura desmaia de fome, ali diante de todos nós. Após ser atendido, como medida emergencial, corremos uma lista para fazer uma compra de alimentos para suprir a necessidade do funcionário, já um senhor de certa idade. Pedreiros, carpinteiros, ajudantes, motoristas, nós do almoxarifado, merendeiras e porteiros assinaram a lista. Quando fomos levá-la para o interior da prefeitura, onde funciona toda parte burocrática, fomos impedidos pela secretária do prefeito, alegando que o mesmo não havia permitido. Acredito que ele teria impedido, mas pelo histórico credito muito mais a um hipócrita rato de igreja que atendia pelo cargo de chefe de gabinete.

O burburinho do indigesto “organograma” estava tomando corpo.

Dois dias depois do desmaio do funcionário, aparece a secretária do prefeito com uma lista para arrecadar dinheiro para comprar um presente para o aniversariante alcaide. Na lista constavam os nomes de todos os funcionários, seguido de um espaço onde seria colocado o valor da “espontânea” contribuição. Eu me recusei a assinar. Muitos o fizeram. Alguns, mais irônicos, deram a moeda de menor valor à época.

Com a coisa fervilhando começamos a articular a criação de uma associação de funcionários.

Como todas as sacanagens politiqueiras do Brasil, tentaram a aprovação desse projeto em uma sessão da câmara, onde aparentemente não estava em pauta.

Através de informações de simpatizantes ficamos sabendo da manobra. Tivemos tempo de nos articular e acredito ter sido uma das poucas vezes em que aquela casa, chamada do povo, esteve lotada. Todas as cadeiras lotadas, corredores laterais lotados. Puxa-saco anotando nomes, vereadores assustados.

Pressionados pelos funcionários, os vereadores tiveram que fazer uma concessão, permitindo que eu falasse, como porta-voz do movimento, durante a sessão. Até onde sei, medida ilegal pelas normas da casa.

Possesso, falei sobre funcionários desmaiando de fome, sobre o escarnecimento que representava a lista de presente do prefeito. Falei sobre os objetivos de caráter perverso do tal projeto. Falei sobre perseguições a funcionários. Falei o que devia. Também falei o que, no entender deles, não devia. E finalizei com um sonoro “nós fechamos essa merda” caso o “organograma” fosse aprovado. Vereadores cabisbaixos e mudos. Não fizeram a votação do cujo dito. Sentimo-nos o máximo. Já era uma vitória.

Ao término da sessão, já do lado de fora da câmara, conversando ali com os funcionários, o puxa-saco que anotava os nomes dos presentes, aliás, um fiscal de feiras livres, vem todo dengoso conversar comigo. Meto-lhe o dedo na cara e grito pra ele sumir da minha frente, antes que o arrebente na porrada. Clima tenso. Gente me segurando.

Nesse clima, um dos vereadores da base do prefeito, coloca a mão em meu ombro, querendo conversar comigo. Viro e desfiro um safanão que pega no braço dele.

- Tira as mãos de mim, filho da puta. Você é meu inimigo! Tira as mãos de mim! Vou pra cima dele até que acabam me segurando novamente.

Em seguida ele vai até a delegacia prestar queixa por agressão. Queixa posteriormente retirada por influência de outro vereador amigo de meu pai. Soube dessa história tempos depois.

Conclusão: a prefeitura foi demitindo todos os funcionários mais ativos envolvidos no movimento de articulação da associação. Pressionou e ameaçou os demais. Formaram uma chapa com funcionários bajuladores. Chapa única. Desarticulados bebemos do nosso próprio veneno. Eu como era concursado e não havia um motivo para processo administrativo, fui encostado, como castigo, no arquivo-morto da prefeitura.

Aprovaram, claro, na calada da noite, o fatídico “organograma”. Sem oposição.

Diante das tantas demissões solicitei uma licença sem remuneração, seguida de minha exoneração.

DAS DISPONIBILIDADES

Só fujo para lugares que me amedrontam.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 24

Alguns momentos penso em escrever um texto contundente e indignado sobre esse brasil (sim, minúsculo) dos desmandos legislativos, executivos e judiciários.

Penso em um libelo profundo em oposição à superficialidade da nossa classe média e o grotesco apetite da burguesia insaciável.

Penso em um ato que seja o antídoto final contra a violência bestial da polícia militar. Um antídoto que se estenda às violências contra crianças, negros, pobres, mulheres, homossexuais ou indígenas.

Penso em um manifesto que extirpe as desigualdades, a exploração, os preconceitos e discriminações.

Penso em teorizar sobre todo mal provocado pelas crenças religiosas. Teorizar sobre o fim dessa praga “divina” a solapar o entendimento, o dinheiro e a consciência dos seres humanos.

Penso em colocar a primeira e última pedra sobre o túmulo do capitalismo.

Penso em cada nova personagem maléfica que terei que trocar quase que diariamente na malhação conformista do Judas.

Penso nas soluções definitivas para todos os fatos diários, de incompreensível emaranhado, que marginalizam uma nação. Penso no fim do estado.

Penso em todos que pensam. Em todos que pensam que pensam. Naqueles que não pensam. Em outros que penso que não pensam.

Penso no que pensam sobre o que penso ou não penso, ou mesmo se penso.

Suspenso, penso.  

Penso. Penso. Penso. Penso. Penso. Penso... 

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 25

Todo pensamento suicida é um enfrentar a vida. Toda vontade de viver é um ceder à morte.

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 24

Prefiro estar mais próximo ao ato de suicídio que qualquer vizinhança com a vontade de viver. A vontade de viver é cega, reducionista e alicerçada na fé. 

AIROSIDADE

O pó que a luz do sol transborda pelas frestas.
O orifício que goteja imensas nuvens negras.
A espuma branca, solta, que finaliza oceanos.
A seta cega, leve, limitando infinitas retas.
Os insetos em voo leve tecendo rendas.
Os átomos, átimos do além supra-humano.


Sobre a mesa palavras que desgasto em bocejos.

OBLITERATURA

"A literatura (e talvez somente a literatura) pode criar os anticorpos que coíbam a expansão da peste da linguagem."

(Italo Calvino, em Seis Propostas para o Próximo Milênio)

NOTÍCIAS DO PLANETA ONDE NÃO VIVO

A imprensa publicou uma série de fotos, durante uma premiação tragicômica, que presumidamente demonstram uma intimidade política entre o juiz Sérgio Moro e Aécio Neves. Eles ali, entre abraços, sussurros e risadas.

Essas fotos viralizaram como piada, afinal vivemos no país da piada pronta.

O mais cruel, além da proximidade política dos envolvidos, foi uma série de montagens onde sugerem uma relação homossexual entre Moro e Aécio, com a intenção de desmoralizar ainda mais a proximidade entre os dois. O velho humor disseminando preconceitos. Quando a questão política não basta, apela-se para a questão dos gêneros. 

A coisa foi fartamente compartilhada. Acredito que com muitos risos e comentários cheios de humor malicioso. Até onde sei, por gente que se arvora contra os preconceitos. Paladinos das igualdades. Provavelmente aqueles que se "orgulham" de ter um amigo gay. E, ironicamente, compartilhada por muitos homossexuais.




segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

O INFERNO DAS PALAVRAS

Todo poema vivo não passa de um rascunho que se pretende definitivo. 

FICÇÃO CIENTÍFICA

William Gibson é o nome. Basta ler a trilogia Sprawl, composta pelos livros Neuromancer, Count Zero e Mona Lisa Overdrive.

Gibson é um dos maiores nomes do gênero ficção científica que se convencionou chamar Cyberpunk. Criador do termo "ciberespaço", vocês entenderão onde a trilogia fílmica Matrix foi beber.

Vale muito!

PARA QUEM GOSTA DE LER

Como Ficar Sozinho, A Zona do Desconforto e Liberdade. Três livros de Jonathan Franzen. Três livros que representam aquilo de melhor na literatura norte-americana. Os dois primeiros são ensaios e o terceiro ficção. Muito foda!

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 23

Derrota é a capacidade de assimilar, ou não, a dita cuja.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 23

Liberdade individual é cada qual tentar impor suas soluções democráticas.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 22

Não existe restrição quando se é de domínio publico.

domingo, 11 de dezembro de 2016

DOS HUMANISMOS

Estou na praia, sossegadão, tomando uma cerveja e olhando aquele mar imenso e aparentemente límpido. Ouço perto de mim:

- Era bandido, tem que se foder! É traficante! papo sobre mais um garoto negro, filho de uma determinada cantora, morto em mais um tiroteio com a polícia.

Não, não vou me meter. Quero descansar.

Depois de tantas conclusões "humanistas", do mesmo local, em fúria, explode:

- Tem mais é que privatizar tudo. Só assim pra funcionar. Essa roubalheira já vinha do governo Lula. Tem é que meter essa gente na cadeia, matar todo mundo! E continuou seu discurso sobre privatização.

Não, não me meti. Eu só vim até aqui pra tentar descansar.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

DAS CONSPIRAÇÕES

Quando decidi criar esse blog, Textos Improváveis, o fiz com a intenção de guardar algumas coisas que escrevi, fora da poesia. Depois, pelo improvável, resolvi fazer dele uma espécie de armário da memória. Guardar determinadas coisas da minha vida, que perdi sobre a vida, por exemplo, dos meus pais. Histórias, claro, sob a ótica do narrador. Pra engrossar o caldo, decidi colocar uma série de frases sérias, humoradas, mal humoradas, irônicas ou ácidas, relacionadas ao modo como vejo aquilo que está acontecendo. O mundo em mim.

Excetuando-se textos onde pessoas são citadas nominalmente, evidentemente nas memórias, nada nele é dirigido a alguém específico.

No início só anunciei sua existência apenas para uma pessoa. Achei e acho que aqui é um grande diálogo com o blog do Drigão. Tanto deu conversa que estamos articulando aos poucos sobre um projeto juntos. Assim quero.

Depois, por uma questão de carinho e respeito, dei conta da sua existência para mais algumas pessoas. Não sei, acredito que não muito mais que duas, nem muito menos que quatro. É um blog muito pessoal e não tem como objetivo ter leitores ou seguidores. O menos é o que vale aqui.

Ainda assim chegam mensagens do espaço: mano, alguém disse que, e publicou que, seria por isso, aquilo... não vai responder? Procuram fazer ligações extraterrenas daquilo que aqui publico com publicações de outros em outros lugares.

Desculpe-me, meu irmão, não vou entrar nesse jogo, se é que existe algum jogo. Prefiro acreditar muito mais em teoria conspiratória. Não me interessa o que disse ou quem disse. Se, por suposição, haja verdade nisso, ignorando nada me atinge. Pra esse tipo de picuinha eu teria continuado no Facebook, que se presta bem a esse tipo de coisa. Segredos públicos.

Pergunto que razão teria um blog que não se promove em reduzir-se a intrigas para querer atingir alguém. Logicamente não vou impedir ninguém que, inadvertidamente o descubra, entre nele e até se identifique com alguma postagem. Isso acontece, pois atiro para todos os lados. Mas você não está nele!


Havendo diferenças, desentendimentos, rusgas e conflitos, prefiro que me chamem para conversar. Sempre estou aberto ao entendimento. Estou muito velho pra pequenas coisas.

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 22

Minhas vergonhas não vestem calças.

EU, ALI SOZINHO, ÉRAMOS MUITOS!

A infância é geralmente tratada de forma pueril, onírica, onde a inocência prevalece sobre os distorcidos valores dos adultos. Não falo aqui da infância miserável sustentada pelo mundo adulto e sua civilização e civilidade exploratória, resignada em sua compaixão judaico-cristã.

Todos nós sabemos que essas doces histórias infantis são frutos de poetas e escritores cujo açúcar transborda pelas páginas. Histórias infantilizadas. Omissas para o resguardo de memórias de mérito e admiração. Na maioria das vezes todos somos assim.

A primeira violência na mutação da minha infância em adulto precoce se deu quando tinha por volta de quatro ou cinco anos. Como já citei outras vezes, meu pai irascível e alcoólatra. Um dia totalmente embriagado começou a brigar com minha mãe. Provavelmente minha irmã, com nove ou dez anos, chorava no quarto. Meu irmão, com dois ou três anos, no berço. Repentinamente, em meio à discussão, meu pai pega uma cadeira para agredir minha mãe. Não sei como, chorando, me coloquei entre os dois para impedir a agressão. Só me recordo do meu pai me olhando com olhos esgazeados, parado, sem ação, segurando a cadeira acima da cabeça. O depois é densa neblina.

Creio que logo após esse fato meu pai parou de beber.

Acredito que minha infância foi razoavelmente dentro do normal. Sempre tive muitos amigos. Mas, paralelo a isso, desenvolvi um mundo muito particular. Brincava com os amigos, mas achava tudo aquilo muito previsível, sempre igual. Era quando eu entrava em meu mundo e desenvolvia minhas brincadeiras, inventando histórias, criando amigos e inimigos, desenvolvendo artefatos com pedra ou madeira. Eu, ali sozinho, éramos muitos. Infinitas perspectivas.

Foi quando também comecei a me dedicar mais ao desenho, por influência de meu pai, que também desenhava razoavelmente bem. Desenhar, para mim, sempre foi um ato muito solitário, só houve uma exceção onde trabalhei um desenho em conjunto com outra pessoa. Mas isso é outra história.

Passados alguns anos veio a renúncia do Jânio Quadros, seguida de toda dificuldade da manutenção do João Goulart na presidência, Adhemar de Barros no governo do estado e finalizando com o golpe militar de 1964. Período de perseguições políticas, onde minha mãe perdeu seu cargo no hospital psiquiátrico do Juqueri e meu pai foi transferido para uma colônia distante, onde não havia nem condução para se chegar. Comprou uma bicicleta.

Sem entender o que acontecia via meus pais queimando documentos, propagandas políticas, falando baixo e retirando o diploma de vereador, cargo que meu pai exerceu no município de Franco da Rocha, até então enquadrado na parede e exibido com orgulho. Foi quando ele voltou a beber.

Lembro-me do primeiro dia dessa nova fase. Todos nós, em casa, preocupados com sua demora em chegar do serviço. Minha mãe tentando saber com um ou outro alguma notícia... e nada. Chegou tarde da noite. Bêbado. Eu com meus nove ou dez anos nunca senti tanta vergonha quando de manhã, ao ir pra escola, meus primos e amigos vizinhos perguntavam sobre a carraspana do meu pai. Virou hábito.

Brigas se sucediam. Passado algum tempo, ele totalmente embriagado, começou uma violenta discussão com minha mãe. Quando percebi, ele estava com uma faca na mão, indo pra cima dela. Em um daqueles momentos em que a ação é mais rápida que o pensamento, me atirei sobre ele, arranquei a faca da sua mão. Fiquei de frente pra ele, meio caído sobre a mesa da cozinha, e comecei a enterrar a faca em meu próprio peito. Não, não estou fazendo literatura.

- Você quer um morto, então vai ter, eu gritava pra ele, chorando e pressionando cada vez mais a faca contra o peito.

Nunca. Nunca senti tanta vontade de morrer como naquele dia. Mas não me bastava morrer. Queria que minha morte tivesse como herança a culpa. Queria que minha morte fosse o pesadelo do meu pai. Queria, morto, ser o inferno da vida dele.

Minha mãe rapidamente tirou a faca da minha mão. Ele ali, com o mesmo olhar esgazeado que trago desde os cinco anos. Inerte.

Depois desse dia, até sua morte, meu pai nunca mais colocou uma gota de álcool na boca. Continuou com as discussões normais de casal com minha mãe. Aprofundou-se em seu catolicismo, se aproximando, mais tarde, da Teologia da Libertação. Foi um excelente avô, cujas histórias junto a ele os netos não se cansam de contar, entre risadas. Depois dessa fase, não me lembro de qualquer atitude agressiva por parte dele.


Já em minha fase adulta foi meu grande companheiro. Ficamos em paz. Mas, por tudo isso, ainda choro muito. Um choro sem inocência.

ELA

Estudávamos no mesmo colégio, eu e ela. Nunca fomos amigos, acho que nunca soube seu nome, sei lá se soube o meu. Nunca nos falamos ou nos cumprimentamos, embora ela fosse amiga dos meus amigos mais próximos. Nosso fator de relação era o pátio do colégio.

Sem saber que era meu primo, um dia ela disse a ele:

- Odeio aquele seu amigo (eu), magro, feio, cabelo encaracolado e sempre vestido de branco (meu hábito na época).

Ele me contou. Ainda assim mantivemos a mesma toada. Eu e ela.

Algumas vezes temos que ser objetivos para que o subjetivo não nos exponha.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 21

A ditadura da eficácia promove longos casamentos.

JOGO

Minha amiga Jô disse, após ler o blog:

Como sempre sabendo usar as palavras, em certas ocasiões a seu favor, outras contra você mesmo. rs...

Fico feliz em saber que nessa competição ainda sou meu melhor parceiro e melhor adversário.

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 21

O distanciamento comedido não alimenta raiva, nem indiferença. 

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 20

Sou um caga-regras como todos vocês. As minhas cabem a mim, espero que caguem apenas pra vocês.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 20

As pessoas, de um modo geral, não gostam de expôr suas imperfeições. Claro, isso é também um ato de sedução. Todos são a imagem do deus que criam.

ZEN OU A ARTE DE JOGAR TÊNIS DE MESA

Muito tempo atrás o tênis de mesa se dividia em dois grandes estilos: o sul americano e o oriental. Hoje prevalece de forma absoluta o estilo oriental com japoneses, chineses e coreanos dominando o cenário do esporte.

Os orientais jogam mais colados à mesa. É um jogo rápido agressivo, com a bolinha impulsionada pelas raquetes de nylon. Quase mecânico. O estilo sul americano era plasticamente mais bonito. Jogava-se mais distante da mesa, a raquete de madeira imprimia sua agressividade através dos efeitos sobre a bolinha.

Não sei determinar exatamente o período que abrangeu a atividade de meu pai como jogador de tênis de mesa, mas durante essa época foi considerado um dos três melhores jogadores do Brasil. Meu pai contava, confirmado por seus irmãos e amigos, que Biriba, então o grande nome do tênis de mesa nacional, fez um desafio através de uma emissora de rádio. Sabendo do desafio meu pai respondeu que aceitava, desde que fosse em campo neutro. Biriba se recusou, pois só jogava dentro de casa, ou seja, no seu espaço. Nunca houve esse embate.

Era compreensível essa preocupação do meu pai, e tantos outros jogadores, com o campo neutro. Minha mãe, que o acompanhava nessas partidas, conta que eram situações de grande tensão, que invariavelmente terminavam em brigas. Jogar no campo do adversário era algo temeroso. A torcida da casa literalmente cercava o visitante, limitando seu espaço de atuação, além das provocações. Lembre-se, o estilo sul americano precisa de um grande espaço em torno da mesa. Consequência: porrada!

Embora um grande atleta, meu pai era um boêmio, cachaceiro e briguento. Irascível. Quando no exército, onde passou mais tempo na cadeia por brigas e desobediência, foi convocado pelo coronel Padilha, esse mesmo famigerado militar, até tempo atrás ligado ao comitê olímpico, para defender o Brasil nas olimpíadas como lutador de boxe. Meu pai recusou o “convite”, o que, provavelmente, lhe custou um acréscimo atrás das grades. Diziam que meu pai tinha um murro demolidor.

Quando adolescente, eu olhava com orgulho aquele certificado militar “sujo” de carimbos, que o desabonava como soldado. Pelas prisões acabou cumprindo muito mais tempo além daquele que devia como convocado.


Some-se tudo isso a uma partida de tênis em campo adversário. Era o desespero de minha mãe, mulher extremamente forte, tendo que se engalfinhar com marmanjos, para tirar meu pai de situações onde numericamente era desvantajoso. Garrafas voavam.

Meu pai abandonou o tênis de mesa quando começou a prevalecer o estilo oriental. Ele nunca gostou dessa maneira de jogar e nem tentou se adaptar. Mais velho e já sossegado, foi ganhar troféus e medalhas como jogador de bocha.

Como meu pai, também sempre gostei mais do estilo sul americano de jogar, mas, devo admitir que com os orientais tudo ficou muito mais zen.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

DAS ILUSÕES

Como exigir Estado de Direito quando todo estado é de direita?!

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 19

Para muitos, ou maioria, a preservação de povos em estado primitivo é mantê-los em uma redoma limitada por árvores em todos os lados. Retroalimentação com a obsessão antropológica.

SEIS POR MEIA DÚZIA

Aquilo que se chama esquerda, aqui no Brasil, sempre esteve muitos passos atrás de qualquer evento histórico. Um atraso institucionalizado. Depois de todas as cagadas, estão clamando o nome de Ciro Gomes para a presidência da republiqueta rural. Vamos trocar a burguesia truculenta pelo coronelato de gravata?

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 19

Os desafetos são nossas melhores companhias, pois sabem manter a devida distância.

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 18

Exercer simpatia onde ela não cabe, fica gratuita onde pudesse ser verdadeira.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 18

Herói é apenas uma ficção onde a incompetência da maioria fictícia é uma realidade. 

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 17

Na ânsia de mudar o mundo... ele foi ficando cada vez mais o mesmo.

DAS DEFORMIDADES

Contava minha mãe que, quando criança, morava próximo ao sítio de meu avô, um homem portador de hanseníase, que também já foi conhecida pelo termo pejorativo de lepra. Ela nunca se aprofundou na história desse homem, portanto, além daquilo que segue, nada mais sei a respeito.

Dizia que principalmente as crianças tinham medo dele, provavelmente pelas deformidades, ou incapacidades físicas, que a doença causa. Mas o agravante, ainda no possível imaginário de minha mãe criança, era o fato do portador do mal de Lázaro ser considerado uma pessoa má, que costumava esfregar alimentos em suas feridas e oferecer aos meninos e meninas na intenção de infeccioná-los. É possível? Sim, ainda que não tenha nada que fundamente essa possibilidade, acredito que sim. Mas prefiro centrar minhas deduções no preconceito arraigado que sempre esteve ligado à doença. Presumo que eram histórias contadas por adultos com a intenção de causar pavor e manter suas crianças, já contaminadas pelo preconceito, afastadas do homem doente.


Na estante da memorabilia empoeirada, doente de poesia, o portador de palavras ainda padece do preconceito in-verso. Deformado pelo eterno construir, ao contrário da hanseníase, o poeta não tem cura.

O GRANDE IRMÃO

No mundo virtual, de autômatas vergonhas, o ato de espiar pelo buraco da fechadura é a janela anônima do Google.

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

BREVES ENTREVISTAS COM HOMENS HEDIONDOS

Breves Entrevistas com Homens Hediondos é um filme que mergulha profundamente nas fragilidades e inseguranças do gênero masculino. É realizado simulando uma série de entrevistas feitas pela estudante de antropologia Sara. Apenas homens são entrevistados, encaixados nas mais diversas condições: etárias, econômicas ou culturais. Ela, recém abandonada pelo namorado, procura entender o comportamento masculino em uma projeto de pesquisa universitária. Embora a questão seja densa, o filme é conduzido com muita leveza. Vale muito para homens e mulheres. Preferencialmente juntos.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 16

O acumulador, de itens ou objetos, não lucra nada com sua compulsão. O acumulador de "amigos" espreita boas oportunidades.

AO PÉ DO OUVIDO

Fofoca é uma espécie de literatura menor. Apesar de hipocritamente criticada, é muito divertido observá-la, principalmente quando se é a personagem principal. 

EU, O DEMÔNIO

Nunca pretendi ser um poeta, apenas brinco. Talvez resida aí minha recusada poesia. Brinco, pois conheço. Não tenho falsa modéstia e me divirto com suposta prepotência. Quando publico um poema é mais um esforço em me autoanalisar em relação ao embate que com ele travo. Pouco se me dá opiniões a seu respeito. Nessas pequenas batalhas, somente eu e ele. Exceções raríssimas têm minha consideração no entrevero.

Assim se dá quando faço críticas. Sou um péssimo crítico, pois não pretendo vender livros para ninguém. Nem quero que deixem de fazê-lo. A crítica é minha, não tem direcionamento. Sou o arqueiro, o arco, a flecha, seu voo e o alvo. Não me responsabilizo pelos desvios de direção que, inadvertidamente, atingem alvos de não tão sólida estrutura. Críticas nominais estão carregadas de honestidade, seja pela qualidade ou possibilidade de. Aí é onde sou mais social e normatizado.


Tudo o que faço é uma longa e extenuante conversa comigo mesmo. Querer entrar no papo é perder tempo de aprendizado, de exercícios, de leituras e experimentos. Eu sou minha linguagem. 

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 15

A farda é um fardo que subjuga usuários e vítimas. Camuflada, preta, verde, cáqui ou marrom tendem a ser tintas de ignorância, adestramento e sangue.

DOS PIRATAS

Cida não chegou a ser propriamente uma amiga durante nossa adolescência. Nos conhecíamos através de amigos comuns, nos dávamos bem e aparecia de vez em quando em minha casa. Muitos anos depois, sem ter notícias dela, soube pelo seu irmão que havia casado e estava morando na Itália.

Mais recentemente, quando eu ainda estava ativo no Facebook, nos tornamos contato. Quando veio em férias para o Brasil marcamos um encontro junto a outros amigos daquela época, Aninha e o marido e o Diogenes. Encontro muito bacana de gente que não se via há muito mais que duas décadas.

Passado algum tempo, ela de volta à Itália, me escreveu dizendo que cuidava de uma senhora já idosa, por volta de 90 anos, Adelima Pesenti. Essa senhora contou que os Pesenti há mais de 300 anos eram piratas corsos. Provavelmente em fuga, escaparam da ilha da Córsega para o sul da França, atravessando os Alpes a pé, finalmente estabelecendo-se no norte da Itália. Cheguei a manter contato com Adelima através de um neto, ou sobrinho, que me escreveu.

Excetuando-se a questão dos piratas, a história da saga familiar encontra respaldo nas pesquisas que um parente nosso, de Batatais, interior de São Paulo, faz já há muito tempo. Meu avô, Fioravante Pesenti, e seus pais são da província de Bergamo, norte da Itália. Na outra ponta, ele chegou a encontrar um Pesenti como oficial nas tropas que lutavam pela unificação da Itália, sob comando do Garibaldi.

Sei que hoje, tanto na Itália quanto na Espanha, os Pesenti são nobres, com direito a brasões e tudo mais. Talvez por esse lado "heráldico" são, hoje, grandes empresários, no rol das grandes famílias burguesas italianas.

Não tenho grandes ligações com meu sobrenome Pesenti e muito pouco com outras pessoas que o carregam com orgulho infundado. Não fico pesquisando ou coisas do gênero. Sou mais atento com as histórias contadas por pessoas. Mas, admito, a questão dos piratas corsos foi aquilo de mais próximo a justificar eu carregar, sem muito desprezo, esse apêndice no final da assinatura.

CANÇÕES DE NINAR


Esse texto eu publiquei, coincidentemente, em 6 de dezembro de 2013, dentro de uma pesquisa sobre violência, para a revista Rebosteio, que publicávamos à época.

DIOGUINHO & O NEOLIBERALISMO

Há décadas que o poder público no estado de São Paulo transformou-se em celeiro e, evidentemente, coiteiro para toda sorte de desmandos e crimes do chamado neoliberalismo. Na verdade, exercem um tipo de poder não público, mas de acobertamento de uma série de negociatas escusas e questões ilícitas.

Retroagindo no tempo, o fim do século 19, no estado de São Paulo, deu conhecimento a Dioguinho (1863 – 1897), um dos mais famosos, famigerados e procurados bandidos paulistas, que agia na região da Alta Mogiana. Diogo da Rocha Figueira, segundo consta, começou sua vida de crimes aos 20 anos ao matar um gerente de circo que havia maltratado o irmão mais novo de sua esposa.

Entre muitas lendas e exageros o nome de Dioguinho esteve ligado a diversos crimes, muitos verdadeiros, com requintes de crueldade e gratuidade. A imprensa da época, ávida de notícias com esse caráter de violência, tratou de transformá-lo em uma celebridade e, décadas depois, já no século XX passou a chamá-lo de “Lampião de São Paulo”, comparando-o ao cangaceiro, chefe do banditismo no nordeste do Brasil. Em função das 50 e tantas à 100 mortes a ele atribuídas, embora “só” admitisse 24, sua prisão tornou-se questão de honra para a polícia do estado, que mobilizou boa parte do seu contingente para diversas tentativas de captura.

Por outro lado, o “matador dos punhos de renda”, era muito próximo aos coronéis do café e chegou até a exercer o cargo de Oficial de Justiça, que lhe permitia, junto ao seu bando, delinquir, intimar e intimidar. Chegou a ir a julgamento por diversos crimes, mas era absolvido. Isso até a coisa ficar insustentável.

Na região da Alta Mogiana, onde atuava, compreendida por Batatais, São Simão e outros municípios, Dioguinho tinha muitas relações e, portanto, diversos coiteiros, ou seja, pessoas que o acobertavam dando-lhe guarida, para esconder-se da polícia. Meu bisavô, Desidério, um italiano comerciante dessa região, foi um desses chamados coiteiros do Dioguinho.

Essa história ouvíamos, meus irmãos e eu, de meu pai desde muito cedo. Dizia que Dioguinho costumava chegar durante a noite na casa de seu avô materno, geralmente durante as fugas de algum cerco policial. Nunca entrava na casa, fazia as refeições e dormia sob um grande pé de laranjas, no fundo do quintal, para evitar ser apanhado de surpresa. Como uma espécie de troca de favores, nas conversas sempre perguntava ao meu bisavô se alguém estava devendo no armazém e não queria pagar. Caso houvesse, ele ia fazer uma visita ao devedor no outro dia, que, evidentemente, arranjava um jeito de acertar a dívida no prazo por ele estabelecido. Podemos imaginar o tipo de “argumento” utilizado com essas pessoas.
 
Tempos depois Dioguinho e seu irmão foram emboscados pela polícia, quando remavam em um barco pelo rio Moji Guaçu. O corpo de seu irmão foi localizado, mas o de Dioguinho jamais foi encontrado. Assim, muitos acreditaram que ele não tinha morrido, reforçando a lenda falsamente robinhoodiana que dele alimentaram, fazendo crer que muitos crimes ocorridos décadas após a emboscada eram de sua autoria. 

Assim como em outros países o povo brasileiro tem uma grande identificação e afinidade com o banditismo. Talvez essa “heroificação” do bandido tenha em seu cerne uma oposição ao poder constituído, tão bandido quanto. O banditismo acaba sendo transformado em uma espécie de vingança popular aos desmandos dos poderosos. Claro, isso no imaginário popular, pois grande parte dos criminosos, seja individuo ou em bando, sempre esteve a serviço de algum tipo de poder, seja dos latifundiários, seja da igreja, seja de políticos, comerciantes ou industriais, quando não, desequilibrados que extrapolam em busca de vingança pessoal primeva.

Raramente há um tipo de banditismo que poderíamos chamar de politizado ou, então, com raízes sociais. Caso raro, aqui em São Paulo, é o Meneguetti, com um discurso articulado e anarquista.

Mas... sim, eu falava sobre o neoliberalismo que governa o estado de São Paulo há décadas.

Nem sei se a antiga estrada de ferro da Mogiana ainda funciona, ou se foi desativada para o privilégio da indústria automobilística e petroleira. O grande negócio hoje é o metrô e a CPTM. Claro, a imprensa que naquela época exigia a prisão do Dioguinho hoje nem podemos chamar de omissa, pois compactua de maneira acintosa e criminosa com esse desgoverno. A fantasia romântica foi trocada pela brutalização. Os coitos e o linguajar caipira italianado foram trocados por elegantes escritórios, onde homens de ternos “negociam” em diversas línguas. A polícia já não persegue: está sob ordens. A justiça... quem?

Conta a lenda que dois sujeitos estavam discutindo sobre quem tinha a melhor pontaria. Cheios de fanfarronice iam desfiando suas proezas. Dioguinho, que por ali passava, ficou ouvindo a lengalenga dos dois “campeões” do tiro. Chamando-lhes a atenção, Dioguinho apontou para um sujeito, bem distante, que dormia recostado em um mourão de cerca. Apontou, atirou e matou o sujeito, calando a boca dos outros dois. Mais que uma boa pontaria isso é o neoliberalismo em estado bruto.

 
Como querer que apareçam corpos?

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 14

A forma como a grande maioria aborda, principalmente em redes sociais, a questão de todo tipo de violência praticada por homens contra as mulheres, não melhora o que está horrível e piora o que já está ruim. 

NA TELA

Você pode até ser um bom roteiro, mas eu sou minha melhor personagem.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 13

Educar-se é um rito de passagem pessoal e intransferível. Não confundir com ensinamento e tradição.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 12

Enquanto a Educação for entendida como uma arma, seja de ataque ou defesa, estaremos subjugados à doutrinação.

PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 17

Decidi por ela o amor. Ela, decidida, me amaria. Ela não sabe quem eu sou. Nem imagino quem seja ela. Assim, juntos, concretizamos um conceito.

NÃO ESTOU!

Vivo um processo constante de eutanásia. Minha ausência é a única presença que de mim exijo. 

domingo, 4 de dezembro de 2016

FERREIRA GULLAR

Até onde tive paciência pra ler, a poesia de Ferreira Gullar nunca me encantou. Pra ser sincero, achava chata. A pessoa do Ferreira Gullar, assim como sua poesia, eu também nunca achei grande coisa. Stalinista, há tempos alinhado com aquilo que há de pior e mais conservador nas hostes retrógradas do país, rancoroso e dado a análises sociais e políticas simplistas, quando não rasteiras.


Claro, não há sentido algum em comemorar sua morte, mas, por outro lado, também tenho pouco a lamentar.

DE NOITE NA CAMA

O que ontem a noite foi sólido, agora de manhã é perfume.

sábado, 3 de dezembro de 2016

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS 11

Que o Temer é um merda não preciso ficar falando aqui. Que o pai de um dos jogadores da Chapecoense, morto no acidente, fique indignado com a atitude desse merda no velório, perfeitamente compreensível. Agora, não dá pra engolir o proselitismo dessa esquerda burra, mal intencionada e oportunista, na tentativa de angariar simpatias diante de tal tragédia. Quero que todos vão pra puta que os pariu!!!  

MAR MEDONHO

Minha opção pelo ostracismo é poder produzir pérolas, independente de organismos estranhos.

KANJI

Depois de anos de vontade, estou pesquisando mais sobre a língua japonesa. Língua fantástica, com três "alfabetos" que se completam. O Kanji, que são os ideogramas, o Hiragana e o Katakana, conhecidos como Kana, que são silabários.

Não pretendo aprender a falar japonês, apenas aprender um pouco sobre o processo de construção dessa língua.

Meu interesse maior recai sobre o Kanji. Ah, os ideogramas!

Claro, tudo com o auxílio luxuoso e providencial da minha pequena samurai, a Guta.


PROTOCOLOS EXISTENCIAIS Nº 16

EM ALGUM LUGAR DA CHINA OU CORÉIA

Seres humanos são apenas pequenos objetos manipuláveis, produzidos em série e com obsolescência já programada. Por sua função repetitiva e habilidades limitadas perde o interesse muito antes da sua data de validade estar vencida, lotando porões e sótãos onde se acumulam inutilidades. Poluem e não são recicláveis. Mantenha fora de alcance.

CONSIDERAÇÕES MISERÁVEIS Nº 10

Tive uma curtíssima relação com uma das mais importantes jornalistas de uma grande emissora de TV. Aquilo que nos aproximou foi a poesia. Além de corintiana, a mulher escrevia bem pra caralho. Ainda guardo dois poemas que escreveu para mim, muito tristes, pois eu havia dado uma vacilada feia.

- Rubinho, você no Messenger é um grosso, ao telefone é muito frio e seco, mas ao vivo é uma gracinha. Costumava me dizer.

Não tinha como dar certo, explorando dessa forma meus extremos.

ANDANDO NA LINHA 02

Manhã de verão, indo para o trabalho. Trem absurdamente lotado. As pessoas mal conseguiam mover os pés. Não havia espaço. Tão concentrados que garantiam o equilíbrio no balanço do trem. Batalha de perfumes e cabelos molhados, cheirando a condicionador, que te ensopa a camiseta, compete com o sujeito que tenta ler um jornal, esfregando as folhas em tua cara.

O falatório dentro de uma composição lotada é algo, literalmente, incompreensível. Romances, brigas, futebol, política e fofoca é o suco final desse liquidificador coletivo.

Ao meu lado, em meio a esse burburinho, ouço uma voz mais alterada que se sobrepunha às outras. Era uma senhora de meia idade que gritava histericamente com cada homem que encostasse nela, como fosse possível evitar isso dentro daquela Auschwitz sobre trilhos. E o pior, na tentativa de afastar-se de qualquer homem, ela vinha gritando e se aproximando de costas para mim.

Não deu outra. Bateu de bunda na lateral do meu comprimido e pudico corpo.

Olhou-me e começou a me xingar, dizendo que não encostasse nela e sei lá mais que injúrias e impropérios. Espremendo daqui e dali consegui afastar-me da senhora com pretensões a ser abusada por todos os homens, grande maioria, ali presentes.

- Eu é que não quero ser encostado pela senhora. Não quero ser contaminado! Disse-lhe com um canastrão ar de indignidade.

Entre raivosa e espantada, ela mordeu a isca dizendo que não tinha nenhuma doença.

- Minha senhora, ignorância também pega. Falei olhando firmemente pra ela e mantendo prudente distância.


Com algumas risadas equilibrou-se o burburinho. Calou-se como dormentes.